O LINCHAMENTO DE JOSÉ SÓCRATES
Temos vindo a assistir nos últimos dias, a um verdadeiro julgamento popular do ex-primeiro-ministro, ao ponto de lhe serem atribuídos adjetivos, que nós, nesta fase, não podemos aceitar.
Com a violação do segredo de justiça, o público ficou a conhecer os factos suspeitos e simultaneamente a poder fazer “justiça popular”, sem que o suspeito, em prisão preventiva, possa ter direito ao contraditório.
Sobre o tema, publicamos seguidamente parte de um texto, escrito por Miguel Sousa Tavares, e que veio hoje publicado no Expresso.
Aconselhamos a ler o artigo de opinião que o referido jornal apresenta.
Depois de apresentarmos a parte inicial do texto, publicamos seguidamente, o conteúdo apresentado quase na ponta final:
«(…) Acima de tudo, porém, aquilo que não é possível aceitar, sob pena de total capitulação perante o abuso, é a habitual, mas desta vez absolutamente escabrosa, violação do segredo de justiça. E não me refiro aos jornais de estimação do Ministério Público ou ao 'jornalismo do botox', mas sim a um jornal como o "Público", que, citando "fonte próxima do processo", pespega com toda a acusação do MP no jornal, tratando-a como verdade definitiva e sem ter ao menos o cuidado de perguntar à fonte quais os elementos de prova concretos em que se fundava tal verdade. Não vale a pena alongarmo-nos em considerações sobre a intolerável prepotência que representam estas grosseiras e sistemáticas violações do segredo de Justiça por parte das entidades de investigação criminal: quem não percebe é porque só vai perceber se um dia lhe tocar.
Mas é de uma imensa hipocrisia a vigência de um sistema de segredo de Justiça que permite que na fase da instrução (que, compreensivelmente, é aquela em que é excepcionado o princípio da igualdade entre partes), essa desigualdade legal seja acrescentada por uma desigualdade ilegal que faz com que a defesa esteja obrigada ao silêncio, enquanto a acusação litiga publicamente nos jornais, fazendo passar a sua versão, sem contraditório. Além de mais, é de uma cobardia sem remissão. E que serve dois fins: instigar o tal julgamento do "cidadão comum" e ficar bem na fotografia, quando todos, temerosamente, vêm dizer que "a Justiça funciona". Como se a simples prisão de suspeitos e a divulgação pública das suspeitas, sem lugar a defesa, fosse sinal de que a Justiça funciona! Porque será então que os armários estão cheios de processos assim iniciados e que, uma vez promovido o julgamento popular, nunca mais chegaram a julgamento num tribunal? (…)»
Nós, continuamos serenamente a apreciar o desenvolvimento dos acontecimentos, a confiar na justiça e à espera do desfecho. Respeitaremos qualquer que seja a decisão independentemente do desfecho final.
Com isto, pensamos que a justiça sai bastante desprestigiada e a democracia um pouco beliscada.
Amorim Lopes